Celebra-se hoje a Páscoa. Para os fiéis cristãos, é o tempo mais importante de todos. Supera, de longe o Natal. Nascer, todos nascemos, quanto a ressuscitar, parece que o caso fia mais fininho (se bem que para ressuscitar seria preciso termos nascido, mas isto será tautológico e fora deste âmbito).
Crê a Igreja, una, santa, católica (e portanto universal) e apostólica (e portanto evangelizadora) que a Vigília Pascal é o expoente máximo da fé. Ocorre no sábado seguinte à sexta-feira Santa e anuncia, em primeiríssima mão, a ressurreição, constatada apenas na manhã seguinte pelas mulheres que se dirigem ao sepulcro. E que notícia, e que anúncio!! Para os fiéis, mais cegos ou mais pensantes, esta é, em verdade, a pedra central de toda a cristandade: Cristo vive, Cristo derrota a morte (diz-se até que foi por nós) e todos fazemos parte do Corpo de Cristo.
Muito bem. É a fé, e a fé pode debater-se, argumentar-se, pode julgar-se até, mas não se pode querer ter ou querer não ter: tem-se. Não é apenas racional, direi até que o essencial da fé é vivido e manifesto, não apenas teorizado. Ora bem, mas isto é muito, muito aborrecido. Então temos uma das maiores igrejas da cidade com pouquíssima gente às 22h, quando se inicia a Vigília! Mas porquê, penso eu, se hoje em dia até volta a estar na moda? Depois entendi, e passo a explicar a receita do paroco para o sucesso da missão cada vez mais notória da igreja: afastar as pessoas! Sei de um tal décimo sexto que iria aprovar:
Primeiro, inundem a assembleia com um incenso forte. Poderoso, daquele que se infiltra nos pulmões e que desencadeia uma onda de tosse atroz.
Segundo, ponham o coro a cantar tudo, tudo, em latim. Porque se ainda há quem saiba o que quer dizer kyrie eleison e ora pro nobis, o resto é chinês. Ou latim, neste caso.
Terceiro, dêem ao coro um microfone em 734ª mão, de modo a não se entender mesmo nada.
Quarto, as nove leituras devem ser lidas com um ar de frete. Os salmos gritados, vociferados e resmungados. O evangelho lido da forma mais desinteressante possível.
Quinto, não esquecer, de vez em quando, o próprio celebrante deve regressar ao latim.
Sexto, não avisar quantos são os catecúmenos nem quais os sacramentos que irão receber: assim podem surpreender a assembleia com uma quantidade considerável de padrinhos e flashes fotográficos.
Sétimo, as ladainhas também devem ser em latim, e sempre longas... nunca é demais.
Com isto entretêm o povo durante duas horas e ainda nem entraram na parte da eucaristia propriamente dita. Se tudo correr bem, já existem poucos sobreviventes...
Eu, vim embora. Ele vive, mas não ali, quase de certeza...
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