sábado, novembro 24, 2007
Escrito por Green Tea em sábado, novembro 24, 2007

Andei aqui uns tempos a pensar em escrever qualquer coisa sobre alguma disparidade relativa às criticas sobre o concerto de Jorge Palma no Coliseu dos Recreios. O concerto do primeiro dia, note-se. Eu fui, e de facto, lendo algumas críticas, dá para entender que existe controvérsia, mas não polémica, quando se fala do "Mestre". E pus-me a pensar nestas duas palavras, polémica e controvérsia. O estado, ébrio ou sóbrio, de Jorge Palma nos concertos, pode ser controverso, mas não polémico. Não fere a sensibilidade de ninguém.
Ora o que se segue trata de um assunto não só controverso, como polémico. Transcrevo-o. Já aqui me assumi muita coisa: sportinguista, católica, e agora, psicóloga. Não exercendo, mas psicóloga, a prosseguir arduamente a vida académica. E pensante. Ora vamos lá então:

Estimados colegas,
Venho, por este meio, solicitar a maior atenção face ao exposto e que corroborem a seguinte tomada de posição (aguardam-se as posições da Associação Pró-ordem dos Psicológos, Sindicato Nacional dos Psicólogos e Associação Portuguesa de Psicologia) [...]

TOMADA DE POSIÇÃO DOS PSICÓLOGOS FACE ÀS AFIRMAÇÕES PUBLICADAS NA REVISTA VISÃO Nº 767 (8 de Novembro) PELA PSICÓLOGA MARGARIDA CORDO: «A HOMOSSEXUALIDADE É UM TRANSTORNO DA IDENTIDADE SEXUAL, UMA DOENÇA E TEM RECUPERAÇÃO».

1. Os psicólogos consideram que a homossexualidade e a bissexualidade não são indicadores de doença mental;
2. Os psicólogos devem reconhecer se as suas atitudes pessoais negativas acerca de questões sobre a orientação sexual influenciam ou não a sua avaliação e intervenção psicológicas e procurar supervisão ou encaminhamento sempre que necessário;
3. Os psicólogos devem estar muito atentos ao modo como a estigmatização social (por exemplo: o preconceito, a discriminação, a violência) coloca em risco a saúde mental e o bem-estar das pessoas não-heterossexuais;
4. Os psicólogos têm o dever de reconhecer que as suas visões pessoais pejorativas acerca da homossexualidade ou da bissexualidade podem prejudicar o apoio e o processo terapêutico;
5. Os psicólogos respeitam os estilos de vida e reconhecem as circunstâncias desafiadoras que as pessoas não-heterossexuais vivem no seu dia-a-dia tendo em conta as normas, valores e crenças vigentes na nossa cultura actual;
6. É um dever dos psicólogos buscarem formação e compreensão aprofundada sobre a temática da orientação sexual à luz das teorias e dos resultados das pesquisas mais recentes consensualmente aceites pela comunidade científica psicológica de mérito reconhecido no mundo ocidental;
7. As consequências de uma prática psicológica baseada na ignorância e no preconceito relativamente à orientação sexual colocam as pessoas não-heterossexuais em risco, tendo em conta as pressões de conformidade à norma;
8. O facto de alguns profissionais de saúde mental considerarem que a homossexualidade é uma doença mental, pelo que advogam terapias de reconversão é repudiada, tendo em conta os estudos que demonstram que as consequências destas práticas acarretam dano grave para os indivíduos, na medida em que acentuam os índices de depressão, ansiedade, e intenção e ideação suicida (Sandfort, 2003).
9. Os psicólogos subscrevem as resoluções da Associação Americana de Psicologia que determinam o seguinte:
a. A homossexualidade não é uma doença mental (American Psychiatric Association, 1973);
b. Os psicólogos não participam em práticas injustas e discriminatórias contra as pessoas não-heterossexuais com conhecimento de causa (American Psychological Association, 1992);
c. Nas suas actividades, os psicólogos não enveredam por atitudes discriminatórias baseadas na orientação sexual (American Psychological Association, 1992; Consituição da República Portuguesa, Artigo 13º);
d. Nas suas actividades, os psicólogos respeitam o direito a valores, atitudes e opiniões que diferem das suas;
e.Os psicólogos respeitam os direitos que os indivíduos têm em relação à sua privacidade, confidencialidade, auto-determinação e autonomia (American Psychological Association, 1992);
f. Os psicólogos estão conscientes das diferenças culturais, individuais e de papéis, incluindo aquelas relativas à orientação sexual e tentarão eliminar o efeito de eventuais enviesamentos no seu trabalho baseado em tais factores (American Psychological Association, 1992);
g. Quando as diferenças acerca da orientação sexual afectam o trabalho do psicólogo, deverão obter a formação, experiência, consulta ou supervisão necessárias para assegurar a competência dos seus serviços ou fazer encaminhamentos apropriados (American Psychological Association, 1992);
h. Os psicólogos não fazem afirmações falsas ou enganosas acerca da base clínica ou científica dos seus serviços (American Psychological Association, 1992);
i. Os psicólogos são responsáveis pela eliminação do estigma associado à doença mental quando se refere à homossexualidade (Conger, 1975, p. 633);
j. Os psicólogos opõem-se à consideração das pessoas não-heterossexuais como doentes mentais e apoiam a disseminação de informação correcta acerca da orientação sexual e práticas psicológicas apropriadas, de forma a eliminar intervenções incorrectas, baseadas na ignorância ou crenças infundadas acerca da orientação sexual.

Referências:
American Psychiatric Association. (1973). Position Statement on Homosexuality and Civil Rights. American Journal of Psychiatry, 131 (4), 497.
American Psychological Association. (1992). Ethical Principles of Psychologists and Code of Conduct. American Psychologist, 47, 1597-1611.
Conger, J.J. (1975). Proceedings of the American Psychological Association, Incorporated, for the year 1974: Minutes of the Annual Meeting of the Council of Representatives. American Psychologist, 30, 620-651.
Sandfort, T. G. M. (2003). Studying sexual orientation change: a methodological review of the Spitzer study, "Can some gay men and lesbians change their sexual orientation?". Journal of Gay and Lesbian Psychotherapy, 7(3), 15-29.

ASSIM, OS PSICÓLOGOS REPUDIAM A AFIRMAÇÃO DA COLEGA MARGARIDA CORDO, INCENTIVANDO A QUE MESMA ADOPTE AS RECOMENDAÇÕES E RESOLUÇÕES CONSENSUALMENTE PRECONIZADAS PELAS ASSOCIAÇÕES PROFISSIONAIS DA PSICOLOGIA E PELOS COLEGAS PSICÓLOGOS QUE CORROBORAM ESTE DOCUMENTO:
[seguem-se as assinaturas típicas num e-mail do género, e saliento que apenas não assinei por considerar um erro de lógica, se A passou a B e C, e se B e C assinarem e passarem a D, E, e F e G, então começamos a ter listas triplicadas e quadruplicadas]

Lendo isto, surgem-me várias questões. Primeiro, porque temos sempre de nos reger pelos códigos de conduta da American Psychological Association [APA]? Temos códigos de ética em Portugal que regem a conduta do psicólogo (desde o Sindicato, à Associação dos Psicólogos Portugueses, desembocando na Associação Pró-Ordem dos Psicólogos). Somos uma classe demasiado frágil para sermos ouvidos em casos que não metam menores em risco, é a conclusão a que chego.
Segundo, o psicólogo é uma pessoa (graças a Deus!) e erra, obviamente. Mas no exercício das suas funções, e sobretudo quando se trata de atestar uma dada opinião, há que a basear em dados científicos, sob pena de continuarmos a ser vistos como "os que tratam dos maluquinhos no divã" (confesso que nunca tive um divã no consultório e que Freud nunca me entusiasmou particularmente). Se não sabemos dados científicos suficientes, fechamos a matraca, ponto final! E era o que esta colega deveria ter feito. Estou farta de ver a profissão enxovalhada por gente de fora (psiquiatras, pessoal de psicopedagogia curativa, etc.) enquanto há quem a leve a sério, procurando realmente encontrar, de forma científica, mas humana, formas terapêuticas, abstractas ou concretas, de fazer da arte da relação humana uma terapia eficaz e efectiva.
Caramba (ou pior!), esta mulher devia ter qualquer penalização. Como psicóloga, deveria saber que a homossexualidade não é uma parafilia (ou seja, não é uma perturbação no objecto do desejo sexual), e essas sim, são patologias ou perturbações, sobretudo se agidas (a tal diferença entre pedófilo, que por si só é insuficiente para que haja abusadores de crianças). Há varios tipo de parafilias, há quem se excite com pés, com pedaços de roupa, com crianças, enfim, mas ser homossexual ou bissexual é, efectivamente, desejar sexualmente alguem do sexo oposto. Não pelas mãos que tem, pelos pés que tem, pelas roupas ou cabelos, mas pela componente sexual que tem. Não é normal? Não, normal é a média estatística, e aí podemos dizer que não é normal. Mas eu assim sendo também tenho um cabelo anormal, uma estatura anormal, e assim por diante.

Talvez me tenha revoltado tanto isto porque o meu primeiro caso clínico foi precisamente um rapaz homossexual. Um espanto de rapaz, um amor de rapaz, com montes de problemas. Sérios. Nenhum deles era a homossexualidade. Podia ser, mas não era. Podia ser, tendo em conta que por vezes podem surgir questões relativas a dificuldades no estabelecimento de uma identidade. Porque não é fácil ser "anormal" e "contra-natura" (no limite, nós seres humanos somos tudo, menos pró-natura, mas enfim, este parêntesis fica para depois).
E talvez me tenha revoltado mais porque a psicologia é ainda vista como parente pobre da psiquiatria.
Mas de certeza que me revoltou em tal escala porque ninguém dá um estalo a esta mulher (figurado ou não), a obrigou a retractar-se, nada. Manifestar repúdio é claramente insuficiente. Há aqui toda uma massa social que não tem entendimento científico para exercer juízo crítico, "esta doutora disse, deve ser verdade".
Cambada de imbecis!!!!
Ah, a propósito, o Palma esteve muito bem...

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quinta-feira, novembro 15, 2007
Escrito por Green Tea em quinta-feira, novembro 15, 2007

Não gosto de dinheiro. Claro que gosto daquilo que o dinheiro permite usufruir, mas não gosto do conceito do dinheiro em si. Sempre fui utopicamente acérrima defensora do sistema de troca directa. Utópica, claro, como em muita coisa na minha vida.

(pequeno parêntesis sobre a subjectividade deste sistema: como é que meia dúzia de ovos pode valer cerca de uma perna de meio litro de leite? Bem, a troca directa apenas remove o passo de valorar o dinheiro em si: porque é que um litro de leite custa 50 cêntimos e não 20 euros, por enquanto? Tudo se resumiria à lei da oferta e da procura ... utopicamente, repito)

Ora estava eu a dizer que não gosto de dinheiro, e é verdade. Em termos efectivos, está estudado e constatado que falar sobre dinheiro é mais tabu do que falar sobre sexo (?!) e eventualmente, refiro-me não a conversas de ter ou haver, mas de gestão mais ou menos eficaz de orçamentos.
Adiante, dinheiro está intimamente ligado a essa fantástica instituição que é O Banco. Intimamente ligado não foi mera escolha de palavras. Intimamente e imoralmente ligado.
Tendo em conta que regra geral sou uma pessoa assertiva e dotada de alguma argúcia, pediram-me para ir hoje a um banco para acompanhar uma pessoa que tinha algumas dúvidas relativamente ao sistema de pagamento do cartão de crédito. Ora o cartão de crédito é um paradoxo. Precisa do cartão de crédito quem tem menos dinheiro, e não o contrário, e não obstante, é nos cartões de crédito que os bancos conseguem esmifrar uns juros bestiais. A sério! Ora então, lá estava eu no balcão do dito banco, a tentar entender os extractos quando pergunto porque é que o excesso de plafond de um mês aparece duplicado. Ah e tal, "é porque é assim". É preciso ser muito ingénuo. "É assim"? Mas é assim, como? Nada no contrato diz que o banco tem um juro de 100%. Mas é assim, sim senhor, vou exemplificar. Pensemos num excesso de plafond de 100 euros. Imaginemos que esse montante não é pago. No mês seguinte, o simpático programa do banco, computa que o excesso de plafond é de 200 euros, mais juros. E se dos 100 euros iniciais se amortizassem, vá, 50 euros? Bom, então ficavam 50 desse mês, mais 50 do mês seguinte. O dobro. Cem por cento. E onde está isso escrito no contrato? Não, é que nem nas letras pequeninas.
Perguntei à possivelmente atenciosa senhora como lidariam com tamanho acto de omissão. "Ah, mas não é suposto as pessoas ultrapassarem o plafond". Justo e correcto, correcto e afirmativo. Mas então não era mais simples o cartão ficar impossibilitado de efectuar transacções? Alguma coisa de positiva a situação tem de ter para o banco. Mais, deveria vir explicitado em qualquer das maneiras. Num contrato, é regra vir explicitada a penalização derivada do incumprimento de um dos contratantes... mas não.

Este episódio toma, para mim, proporções que roçam a revolta. Claro que podem dizer trinta e um bons motivos para ver "o outro lado". Eu vou continuar a preferir a troca directa. Sem crédito, nem fiado. Directa.
O que me dão por dois quilos de cerejas? Pensantes, já agora ...
EDIT do dia seguinte: Aaaaaah! Afinal, afinal "enganaram-se". Afinal não "é assim. Afinal, afinal ... ao menos isso. Herrar é umano ... Resumindo, fizeram mal as contas, o programa estava certo, a interpretação estava errada ... ainda bem para quem ia ficando prejudicado.

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sábado, novembro 03, 2007
Escrito por Green Tea em sábado, novembro 03, 2007

aqui tinha referido o meu descrédito relativamente às novas práticas parentais. Estas novas, ou não tão novas assim, de fazer crescer e amadurecer o suposto futuro do nosso país. Eu já devia ter aprendido ou pelo menos já devia ter tentado habituar-me à ideia de que os procedimentos de antigamente (sim, aqui o antigamente refere-se mesmo à minha geração) diferem e muito dos actuais. Mas há coisas que me tiram do sério...
Irrita-me que quando uma pessoa de idade resmunga por não conseguir passar depressa entre dois skates, os putos resmunguem ainda mais e chamem nomes à senhora. Irrita-me que alguém não tenha ensinado a estas crianças o valor do respeito. É possível que seja cultural, que nós, ocidentais quase americanizados, não entendamos os proveitos que vêm da idade. Ainda que a idade possa corresponder ao decréscimo da produtividade efectiva, corresponde também ao acréscimo da sabedoria e da experiência. Mas é impossível que tal culturalidade absurda sirva de desculpa ou justificação. Se os procedimentos, os rituais e as maneiras se alteram, os valores, esses não se podem alterar. Valores, sim. Sei que os meus pais tinham regras muito mais rígidas, e que as puderam flexibilizar por forma a que eu tivesse os mesmos valores abstractos, concretizados de formas diferentes. Não se namora à janela, mas não se põe os pais fora de casa para se poder namorar à vontade (sim, isto acontece!!!).
Mas ainda mais me irrita o seguimento daquilo que já tinha escrito aqui. Que os miúdos se tornem tiranos dos graúdos. Que, sem conhecimento ou compreensão de determinadas realidades da vida, exijam seja o que fôr "só porque sim, porque eu quero". Eu vi isto na semana passada ("ah, eu quero este [...] porque é o melhor e levas porque eu quero"), e juro que me iam saltando os olhos das órbitas, passando o devido exagero. Não pela arrogância do miúdo (a quem certamente devem ter faltado uns quantos olhares bruscos que o meu pai sabia tão bem fazer), mas pelo terror submisso da mãe.

Como vai ser quando estes terroristas forem pais? Não sei, e infelizmente deve ser na altura em que já sou eu quem tem dificuldade em passar entre skates.

(isto quase me faz ter pavor de pensar em ser mãe ... ou terror ou ter a noção de que os meus filhos vão ser quase ostracizados porque faço questão de não formar terroristas [e daí, duvido que alguém faça questão de os formar ... mas isso é outra história!])

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