... no referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Estou há semanas para escrever sobre este tema, parece que é hoje.Existem duas forças aparentemente opostas em mim, mas ambas me dizem o mesmo. Se, por um lado, a minha fé me diz que devo prezar a vida, nunca foi a fé a decidir as minhas convicções políticas. Por outro lado, se a minha esquerda me diz que devo ousar a liberdade de expressão, não compreendo como esta mesma esquerda se pode arrogar a criticar o meu voto consciente e esclarecido.
Há um certo sabor a hipocrisia neste referendo. Abordam-me na rua militantes do “sim”, porque sou mulher e sou jovem, como se estas duas características fossem emparelhadas com o meu voto. Mas não. Não concebo como se pode investir dinheiro em clínicas de aborto e não se investir o mesmo dinheiro na facilitação de métodos contraceptivos. Ah e tal, há a distância aos centros de saúde, mas não acredito que façam clínicas de aborto em cada esquina. Ah e tal, mas são caros, mas isso também os meus inaladores para a asma, e não é por isso que não os tomo. Ah e tal, mas falta educação sexual, mas caramba, então esta gente é adulta para abrir as pernas mas não para tomar a pílula ou pôr um preservativo?
Melhor melhor só mesmo o argumento da liberdade da mulher, esse ser raramente emancipado. Caramba, sou mulher, decido o que quero fazer com o meu corpo. Neste momento, apetece-me esmurrar uma pessoa, talvez deixá-la inconsciente. Escolhi, tenho liberdade. Não devo ser penalizada por isso? Quando o posso evitar? Enfim ...
Já me chamaram retrógrada e radical. Seja. Chamem-me de tudo, mas poeta castrado é que não, já dizia o outro. Eu continuo a votar não.