Agora já tudo parece ter amainado relativamente ao caso no Carolina Michaëlis (a propósito, alguém sabe quem foi?). Para mim a questão não é tão pertinente por se dever a um jogo estúpido e desnecessário de poder, mas sim pelas implicações práticas que tem naqueles que serão o futuro deste país.
Estar a dar aulas ao primeiro ano da faculdade é extraordinário. Faz-me recordar o gosto que tenho pela transmissão de saber e de espírito crítico, de uma forma o menos maçuda e aborrecida possível, mas sempre nos limites do que é e do que não é. Por mais que gostemos de divagar, as bases do conhecimento não são nem podem ser alteradas. Ocorre que o primeiro ano da faculdade é, em certa medida, especial. São sobretudo gaiatos e gaiatas que acham que vão mudar o mundo sem ter de saber nada. Acabadinhos de sair do secundário, estão habituados a um modelo de interacção com os professores que, em boa verdade, me arrepia.
Na semana passada o grupo que teria de apresentar a aula resolveu, após umas boas semanas de aviso, chegar em cima da hora. O que é, claramente, inexperiência face "aquelas coisas que mesmo que sejam improváveis, vão acontecer apenas para demonstrar a lei de Murphy". Depois de umas tantas complicações, peripécias e amuos, lá lhes expliquei que não havendo projector, e tendo em conta que a turma é pequena o suficiente, mas sobretudo que não pretendo avaliar powerpoints (mas sim o conteúdo e a forma pessoal de como apresentam), o melhor mesmo seria apresentarem com o portátil virado para a turma. E lá nos sentámos em meia lua a ouvir e a ver... Um chorrilho de disparates que nem quem estava a apresentar estava muito certo do que queriam dizer. Mas mesmo não sabendo, decidiu pôr na apresentação. E quando questionados sobre o que queria dizer uma frase que tinham acabado de ler (sim!, ler, que esta gente ainda vai de folhas quadriculadas para a apresentação!), a resposta que obtive foi "A stôra está a envergonhar-nos". Bom, apeteceu-me responder que não, que para isso eles já estavam a fazer um excelente trabalho. Mas optei por explicar, pela enésima vez, que preferia um trabalho pensado a uma colagem de artigos...
De seguida fui ver a apresentação da outra turma prática, leccionada pela minha colega e regente da cadeira. Ora o grupo, sem projector, recusou-se a apresentar trabalho. Pior que isso, ainda refilou e amuou quando achámos que não era desculpa (blá, blá, esta dependência da tecnologia ainda atrofia as mentes destes pseudo-alunos). Mas não foi isso que me chocou. Efectivamente, nesta turma, ninguém se calou durante uma boa meia-hora. As raparigas que estavam sentadas atrás de mim, e que desconheciam quem eu era, falaram meia-hora sobre um vestido cor-de-rosa às riscas, eu ouvi!!!
Foi quando me passei. Ora estes monstrinhos não percebem que não são obrigados a estar nas aulas, e que estão lá porque decidiram que queria seguir este curso? E que para isso, têm de trabalhar? Em vez de colocarem já os cenários de quando estiverem a trabalhar com os pacientes? Mas terão a mínima noção do que os espera??? E quando vi um telemóvel sorrateiro, vociferei que aquilo não era o secundário onde se reproibiam os telemóveis. Ali, não havia telemóveis. Ponto final, não aberto a discussão.
Enfim, amanhã é dia de aulas outra vez. Saio da capital pelas 7h, saio de Évora às 12h45. E depois siga para o trabalho. Assim muito para o cansada. E a pensar que aqueles terroristas não sabem a sorte que têm.
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